domingo, maio 28, 2023

POR QUE NÃO TEMOS HERÓIS

 

O Brasil é um país que parece não ter heróis, pelo menos daqueles heróis típicos: os que tiveram um papel histórico e relevante na vida do povo, serviram de exemplo e por isso influenciaram mais ou menos positivamente toda uma nação. No entanto temos os anti-heróis, aqueles personagens que desempenharam um papel significativo na vida de um povo, mas de maneira negativa, que foram um mal exemplo, que mostraram falta de escrúpulo, cometeram injustiças. Um espécime típico de anti-herói que temos, e ainda vivo, é o Sarney. Vale lembrar que tivemos um herói, que foi Tiradentes, mas não sei se podemos considerá-lo tanto, visto que toda sua fama é devida mais a violência da repressão do que pelos seus feitos. Andou ele, por um tempo, falando em independência, em emancipação do povo, isso dizia nas rodas de botequim e em portas de comercio. A reação desmesurada da coroa portuguesa deu uma dimensão extraordinária a essa leve intenção de independência.

Alem do mais o que vemos são anti-heróis. Desses temos muitos. Elegeria Getulio Vargas, Dom Pedro, Teodoro e Prestes.

Colocaria Rui Barbosa ao lado de Tiradentes como mais caso de quase herói.

Na verdade, nesse país, até para ter anti-herói o povo encontra dificuldade. O que encontramos  em abundância são bufões, caricatos de herói como foram Brizola e Lacerda, Janio Quadros. Brizola é o exemplo típico de caricatura de herói com sua pobreza de espírito e sua obsessão por ter o poder pelo poder, sem nunca tê-lo de verdade. Viveu sempre cercado por espectros fantasmagóricos que o assombraram a vida toda. Temos a figura de uma caricatura de herói em João Goulart, esse também um personagem simplório e vacilante como poucos.

Poderíamos falar de Castelo Branco, mas ai é forçar a barra, pois Castelo foi colocado no poder por um grupo de militares golpistas, exatamente por ter aquela neutralidade fugidia que povoa a história desse país.

Desde a fundação, quando foi declarado posse do rei de Portugal, esse enorme pedaço de mundo vive dominado por  figuras hora ridículas, ora sinistras.

Outra coisa que salta aos olhos dos mais atentos é a tradição de ser, o país, dominado por uma elite tosca, uma classe dirigente inculta, brega e rococó. Desde a colônia vemos pulular ao longo da história nacional esses personagens cínicos, sem nenhum caráter.

É covardia quando, por exemplo,  tentamos comparar Thomas Jefferson com José Bonifácio, o chamado patriarca da independência. E olhe que estamos falando de uma figura impoluta, muito acima da média dos típicos políticos que povoaram a história do país. Jefferson era infinitamente mais culto e mais humanista que ele.

Voltando ao Sarney, esse merece uma anti-biografia. Esta seria riquíssima em dados sociológicos da cultura macunaímica que imperou desde Cabral  nessa terra do faz de conta.

Aliás, a expressão “faz de conta” consegue sintetizar essa cultura sem caráter, aliada a outra expressão muito comum que é a “para inglês ver”.

De heróis e anti-heróis, por mais que pesquisemos, por mais que estudemos as vidas de todos os personagens da historia do Brasil , fica sempre a dúvida e a certeza. Certeza de que nunca tivemos heróis, dúvida, se pelo menos tivemos um anti-herói genuíno, puro, completo. Não acredito;  a grande maioria de nossos personagens históricos são figuras marrons, fugidias, teatrais, camaleônicas. 

sábado, dezembro 24, 2022

AS FORÇAS QUE SUSTENTARAM AS LOUCURAS DE HITLER

 

Quando culpamos Hitler pela loucura de levar o mundo à maior e mais sangrenta guerra que jamais houve na terra, esquecemos que este era apenas a ponta de um iceberg, um psicopata que se apoiava em amplas forças de elites cínicas, oportunistas, imediatistas, cruéis e desumanas forjadas por gerações passadas, numa tradição de arrogância, de sentimento de superioridade racial e mentalmente formada para culpar outros por seus erros e sua insensatez.

 Hitler e as forças que o sustentaram não conheceram obstáculo na ampla sociedade formada por indiferentes, ingênuos, ignorantes e acovardados cidadãos comuns.

quarta-feira, novembro 16, 2022

CRISTIANISMO PRIMITIVO - MANTER A UNIDADE OU DIVIDIR-SE?

 Nietzsche percebeu bem que o cristianismo nasceu entre o populacho. Esse movimento fez o povo comum, sem poder e vítima de todo tipo de arbítrio, sentir-se além desse mundo, pertencente a outro reino, governado por um rei mais poderoso do que todos os reis da terra. Ao sentir-se como membro de um mundo do além, manifestava profundo desprezo pelo mundo real da política, das guerras, das contendas e brutalidades. Isso causava furor nos governantes da época; daí a perseguição implacável que aplicavam. Mas o movimento prosperou. As perseguições e execuções eram encaradas como confirmação de que pertenciam a outro mundo, de que outro reino, agora de paz e justiça, o aguardava de braços abertos.

Só que a prosperidade do cristianismo gerava, como sob-produto, seu enfraquecimento. Logo formou uma elite acima da massa de crentes fieis e dedicados. Essa elite tomou para si a obrigação de zelar pelos princípios de seu evangelho e todo desvio de interpretação e prática religiosa era encarado como ofensa à suas crenças ou contestação aos dirigentes. Começou, então, a perseguição interna ao movimento.

Na busca de poder para impor unidade ao incipiente cristianismo, sua elite começou a sentir que precisava ter poder, e procurar o imperador romano foi uma conseqüência dessa necessidade.

Portanto, a passagem de igreja perseguida para igreja perseguidora de hereges foi motivada por uma necessidade que os dirigentes sentiam de impor uma unidade de crença ao movimento.

Se compararmos o cristianismo primitivo, e essa mutação criada pelo conluio com o poder terreno, representado pelo decreto do imperador Constantino, e incluir o movimento da reforma protestante, vemos que este último não tinha um império monopolista a que se agarrar e para manter a unidade de sua dissidência. Daí que os protestantes de dividiram em muitas seitas e sub-seitas.

Não tivesse o cristianismo inicial optado pela estatização de seu movimento teria dividido em inúmeras profissões de fé e, provavelmente não teríamos passado por um alongo período do absoluto monopólio e tirania do catolicismo, período esse conhecido por “idade média”. 

quarta-feira, novembro 09, 2022

NÃO PERDER O CONTATO COM A REALIDADE

 Conhecer é interpretar o que sensibiliza nossos sentidos, processado pelo cérebro em forma de interpretação da realidade. Mas ao subtrair os dados da realidade, a mente cria um mundo próprio, quase independente.  É aí que surgem as distorções, os vieses, as tendências. Isso é inevitável. Podemos apenas minimizar essas distorções, nunca anulá-las. Assim, para construir uma realidade mental que não entre em conflito com a realidade que está fora de nós, dedicamos incansavelmente a ajustar, a rever, a aperfeiçoar nossas interpretações do mundo. Uma crença nada mais é que uma interpretação abstraída da realidade e congelada no tempo e no espaço. Uma convicção que se  sustenta em possibilidades, em certezas temporárias pode evoluir, corrigir-se, adequar a novos dados. Já uma crença pode estar apoiada em dogmas e o ser humano gasta suas energias, não em aperfeiçoá-la, mas, sim, em justificá-la permanentemente.

quinta-feira, junho 16, 2022

EUDAIMONIA

 Os estóicos, ao confiar que por trás da natureza humana está a razão, continuaram dividindo o  ser humano entre sua natureza e a consciência dela, como se sem a consciência e com ela a capacidade de usar a razão para se controlar, o ser humano não passaria de uma besta fera. Embora advogavam uma espécie de vida natural, em conformidade com a sua natureza, apelava para o uso da razão para controlar sua própria natureza. Isso é uma contradição  que vemos no Cristianismo, por exemplo, que substitui a razão pela fé, pela obediência a normas sagradas.

A felicidade não tem como ser permanente. Então não existe a possibilidade de se ter uma vida feliz, ou viver permanentemente num clima de felicidade. A felicidade são momentos, fazes curtas de nossas vidas.

Se eu tiver uma dor de dente, não posso estar ao mesmo tempo feliz. A vida é competição, risco, perigo, atacada constantemente por bactérias, vírus, fugos, protozoários, e tantos outros invasores de nosso corpo, sem contar com as ameaças vinda do meio ambiente, dos acidentes, dos acasos, da sorte ou falta dela. Como viver permanentemente  feliz?

Pefiro falar na boa vida. Meu esforço para criar um modo de vida que facilite a conquista e a retenção de uma vida satisfatória. Essa boa vida é a  “eudemonia” que aplico como sinônimo de “boa vida” e não de felicidade como comumente se traduz.

Então a “eudemonia” é nosso objetivo que não se alcança por meio de exercícios, esforço de vontade, obediência a preceitos ou controle das paixões e instintos.

A busca pela “eudemonia” é indireta. Na realidade, acreditamos que ela se estabelece espontaneamente a partir do momento em que adquirimos ciência das coisas e de nós mesmos. A “eudemonia” é fruto da busca de conhecimentos e da incorporação deles por nossa mente.

Antigamente os seres humanos viviam dominados pelo medo, pois ignoravam muitas coisas e o desconhecido sempre apavora. Perdemos o medo psicológicos dos fenômenos naturais quando entendemos o que são e como se manifestam. Para os raios criamos o para-raios e aprendemos como evitar ser atingidos por ele. Isso diminuiu nossas fontes de medos.

sábado, maio 07, 2022

AS LIÇÕES DE SABEDORIA DO COTIDIANO

 

Uma coisa que tentei ajustar, em meu pensamento, foi a de que, diferentemente dos pensadores antigos e principalmente dos teólogos do cristianismo, foi a concepção de que qualquer fenômeno a minha volta, qualquer que  seja, ou mesmo pensamentos vindo  à mente tem significado e sentido, portanto importa valorizá-lo, trazê-lo ao palco das meditações. A vida cotidiana é o mais fértil terreno para praticar o autoconhecimento e apresenta, constantemente, e a toda hora, lições de vida e de verdades que não faz sentido algum ignorar.

Os religiosos, principalmente da versão cristã, tem uma tendência para desprezar os acontecimentos e fatos do cotidiano, comuns da vida humana e como vulgares, sem valor, até mesmo vis e rasteiros. O que tem valor é pensar na espiritualidade, é meditar sobre o sagrado, sobre uma vida superior,  ideal ou coisa desse tipo.

Mas escapando desse dualismo, prefiro cultivar uma vida em que o cotidiano e as reflexões mais elevadas sejam partes de meu trabalho de busca do conhecimento da “verdade”. Observar a vida do individuo comum e estudar a vida dos grandes sábios são partes indissociáveis da formação de uma mente que deseja  estar sempre o mais perto possível da realidade, do mundo natural, quero dizer que sem me aprisionar às interpretações difundidas por outros seres humanos. Observar a vida como inédita, antes de qualquer explicação corrente ou julgamento ideológico, é impossível, pois minha mente já está formada ou faz parte dessa cultura na qual nasci e cresci. Negar as fundações culturais onde apoiei meu edifício de conhecimentos é como tentar negar a língua materna e criar outra própria. Portanto não desejo negar meu passado e a forma de pensar que adquiri; o objetivo é o de superar, é de ir além com liberdade, com ousadia e perseverança. A partir da interpretação do mundo que herdei, tentarei edificar uma estrutura de conhecimento que me leva a verdade, à realidade das leis da natureza, sem me limitar ou usar pré-conceitos.

Não pretendo construir uma nova interpretação da realidade, mas, sim, conhecê-la antes e depois de qualquer interpretação. É claro que isso também seria uma interpretação, pois existe esse dualismo entre o eu que percebe e significa as coisas e o ambiente externo a mim, o que existe fora e independente do eu; o mundo subjetivo e o mundo objetivo. Mas, a intenção pode ser, e vale a pena tentar, de aproximar ambos ao máximo possível. Tentar, na verdade, fundi-los numa unidade. Embora, saiba que nunca se alcança essa fusão, vale a pena o esforça para aproximá-los tanto quanto puder.

terça-feira, março 08, 2022

O APRENDIZ DE OPRESSOR

 

Todo filho, lá pelos 15 anos, entra na fase de aprendiz de rebelde. Foi nessa época que o pai perguntou ao garoto:

- Filho, o que tem aprendido na escola?

- Há, pai, aprendi que você... bem, não posso falar.

- Como assim filho? Pode falar. Sabe que seu pai tem a mente aberta e não recrimina você atoa.

- É, que, pai, que descobri que você é um opressor.

- Opressor?

- É. Opressor porque você é empresário, tem muitos funcionários e explora eles.

- ´Tá brincando?! Eu opressor? Quem pôs essa besteira na sua cabeça, filho?

- Ninguém pai. Descobri por mim mesmo. Minha professora pediu para fazer uma redação baseada na relação entre ricos e pobres na sociedade capitalista.

- Há! É isso? E o que mais?

- Tinha que explicar porque e como os empresários exploram a classe trabalhadora.

- Entendi. E você se colocou em qual classe?

- Eu? Não exploro ninguém....

- Há, é! E quem sustenta você é o trabalhador ou o empresário?

- Como assim?

- Quem dá sua mesada mensal é o empregado ou é seu pai?

- Eu não escolhi ser filho de empresário rico. Nasci e pronto.....

- Pois bem. Já que eu sou explorador dos pobres não seria justo você viver do dinheiro que eu supostamente arranco do lombo dos meus empregados. Então, vou cancelar sua mesada.

- Poxa, pai! Isso é sacanagem!

- Não. Estou apenas querendo respeitar sua convicção e evitar que seja hipócrita.

- Bem pai, não precisa levar isso a sério. Era apenas uma redação. Se escrevesse que o empresário não explora o empregado, a professora diria que estou errado e me daria zero de nota.

- Então o problema é que você se vê forçado a seguir a onda? Tenho uma solução para isso. Vou tirar você dessa escola e colocar noutra que não ensine esses absurdos a você.

- Mas não é absurdo! Você não vive do trabalho de seus empregados?

- Você também vive, filho.

- Sei pai, mas não é exploração?

- O que você acha? Seria melhor ele não ter emprego e dizer que ninguém o explora mas não ter renda nenhuma ou ter emprego e salário para sustentar sua família?

- Acho melhor ter emprego.

- Filho, as coisas são muito mais complexas do que tenta passar sua professora. Eu abri essa empresa porque vi mercado para o que pretendia produzir. Sabia que poderia contratar pessoas para trabalhar pra mim. Imagine que eu não pudesse ter empregado, eu não produziria nada e o pobre não teria renda a não ser por seu próprio empreendimento.

- É complexo mesmo.

- Eu tinha dinheiro que herdei de seu avô e pude ainda contrair empréstimos no banco. Arrumei sócio e comprei o terreno e construí a fábrica. Você acha que o pobre poderia se envolver num negócio desse?

- Seria difícil, resignou o filho.

- Não há exploração só apenas cooperação e parceria. Criei uma fonte de rede para mim com a abertura dessa empresa e criei uma fonte de renda para meus funcionários também. Ambos temos benefícios do negócio. É isso que chamo de parceria.

- Nossa, pai! Estou vendo que é melhor mudar de escola!

quarta-feira, janeiro 05, 2022

FAZ SENTIDO FUGIR DO MUNDO REAL?

O problema da maioria das religiões é que defende o isolamento da sociedade, o cultivo da vida retirada, longe da labuta normal do indivíduo comum. Esse talvez seja o grande pecado das religiões. Precisamos de uma religião ou filosofia que pregue a vida sábia no mundo normal, na vida cotidiana da luta pelo sustento e conforto.  Nada mais salutar e benéfico para a sociedade que o próspero empresário que atua com sabedoria, contribuindo para que o mundo seja um pouco melhor.  O sábio da vida, com recursos financeiros, tem a imensa possibilidade de agir dentro da sociedade com capacidade de gerar benefícios permanentes a uma parcela significativa das pessoas no seu ambiente de influência. Da mesma forma o ignorante ou psicopata pode, com vastos recursos, distribuir sofrimentos e desordens sociais que perdurarão para o longínquo futuro. 

quinta-feira, dezembro 09, 2021

LIVROS PREFERIDOS - WALDEN

 WALDEN  de Henry David Thoreau


                                este está desgastado pelo uso  -  este outro enfeita a estante

Este primeiro livro, em formato de bolso, comprei em 1976 quando tinha 20 anos e o li como se estivesse lendo a bíblia, com a diferença de que lia a bíblia meio que por obrigação dos pais e depois, só com o tempo, por curiosidade. Walden, li cada página com profunda emoção. Sentia queThoreau era meu irmão espiritual, uma alma gêmea, pois em cada frase eu via estampada o mundo que percebia, mas não achava palavras para expressar. Thoreau meu deu essas palavras, auxiliou-me a consolidar os pensamentos e a construir minha própria filosofia de vida.

É claro que passada aquele euforia, me vi caminhando por outras paragens, outros personagens surgiram em minhas leituras. Hoje eu vejo Thoreau como um indivíduo reativo, que negava a sociedade a sua volta, mas sem radicalismo como contraponto. Talvez esse seja o encanto que permanece; criticava seus contemporâneos, mas com certa dose de afeição, sem ódios ou revolta.  Thoreau tinha bom humor e o bom humor é a mais poderosa vacina contra fanatismos e intolerância. Ele tinha um pé no sonho e outro na realidade.

Há uma cena que diz muito sobre sua ironia quase socrática. Quando  os parentes e amigos perceberam que Thoreau estava a beira da morte, atacado  pela tuberculose que destruía seus pulmões, chamaram o pastor  para rezar por sua alma.  Enquanto gemia e tossia em seu leito, o pastor, que sabia de suas duras críticas a religião e ao cristianismo em particular, disse: filho, está na hora de você fazer as pazes com Deus. Ao que Thoreau retrucou num gemido: que eu saiba, nunca briguei com ele. Assim era esse fantástico pensador. Até na hora da morte conseguia manter o bom humor e conseguia proferir sua ferina e fria ironia.

terça-feira, novembro 16, 2021

SER PACIFISTA OU BELICISTA?

 

Imagino que é de suma importância eu ser o melhor dos pacifistas quando entre os pacifistas e o melhor dos guerreiros quando me deparar com belicosos inimigos.

O significado desse pensamento está claro: o melhor comportamento humano é o da flexibilidade. Portanto, que eu esteja sempre adaptado às circunstâncias e não preocupado com princípios se estes forem inadequados ou quando as circunstâncias mudam. Aceitar as mudanças é uma forma de preservar a flexibilidade mental. Não faz nenhum sentido combater a guerra, ostentando ódio aos espíritos conflitivos, ou organizando um movimento do tipo “sou da paz”, vestir-me de branco e enfrentar o mundo com flores.

O que importa é compreender o meio ou o momento que se enfrenta; se é um meio pacifico não faz sentido  ser belicista nesse ambiente. Se meu objetivo é viver bem na comunidade e usufruir dos benefícios de ser membro dela, e inapropriado semear a discórdia e os conflitos, achando que dessa forma vou alcançar benefícios ainda melhores. No longo prazo, uma sociedade sob constante e mútua agressão entre seus membros, não subsiste.

A paz, muitas vezes, é uma estratégia vital de sobrevivência. Tudo depende do contesto ou das circunstâncias. Quando me vejo numa sociedade em que sobreviver dependo de luta e de imposição de alguns sobre os outros, negar-se a lutar é aceitar a submissão e a uma vida de escravo. Se minha sociedade está sendo atacada por forças externas, evocar um espírito de paz é sinônimo de abdicar, de se submeter ao arbítrio de outros.

Por isso que em tempo de guerra é melhor ser um bom guerreiro e em tempo de paz, levantar a bandeira branca do espírito anti-belicista.  


sexta-feira, julho 23, 2021

INTELIGÊNCIA VERSUS SABEDORIA

 

É importante trabalhar a questão da diferença entre “inteligência e sabedoria” visto que, nos tempos atuais, a palavra sabedoria entrou em quase desuso e com isso a diferença entre ambas as expressões também se esvaneceu.  E isso é lamentável.

Inteligência é um componente da sabedoria, mas não é sabedoria. Sábio, podemos dizer que é todo aquele que antes de agir ou falar mede as conseqüência posteriores e tem inteligência suficiente para saber se essas conseqüências serão boas ou más. 

Inteligente é aquele que aprende rápido, domino conhecimentos úteis. Por exemplo, uma pessoa pode ter o domínio da matemática, da música ou da marcenaria, isso é ser inteligente nessas questões. Já sabedoria tem um sentido abrangente, não especifico. O sábio entende a natureza humana e sabe como agir sem negá-la ou condená-la. Usa a inteligência para compreender, Isso quer dizer que compreende que é um produto da história, que vive as conseqüências das escolhas de gerações passadas. Portanto seus recursos para mudar a realidade são limitados, quando não impotentes. Sabe que o que sabe da vida é muito pouco, diante da sua imensa ignorância. Como diria Sócrates, o filósofo grego de século V antes de Cristo: Só sei que nada sei. Sócrates conhecia suas limitações, por isso era um sábio.

Sábios foram Confúcio, Lao tzé, Sócrates, Jesus, Epicuro e tantos outros. Inteligentes foram Aristóteles, Copérnico, Galileu, Newton, Einstein.

 

quarta-feira, junho 09, 2021

A LINGUAGEM MUDOU TUDO

 

Os seres humanos criaram a linguagem para se comunicar entre si e isso mudou tudo. Com a linguagem criou-se um fosso enorme entre nós e os parentes mais próximos como os chipanzés. A linguagem propiciou uma eficiente e fantástica forma de transmitir conhecimento de uma geração para outra. Assim nasceram as ferramentas a agricultura, as invenções facilitadoras da vida e também as armas para caçar, defender e matar rivais. Com a linguagem foi possível chegar aonde chegamos com esse mundo tecnológico, computação, robótica e telecomunicação. A linguagem também evoluiu para encantar, cativar, dissimular, criar poderosas religiões e sofisticadas ideologias. Favoreceu também as estratégias de guerra, de execuções, de invasões, de planejamento de extermínios de povos indesejáveis. A lista é infinita, tanto de coisas boas quanto maléficas.

A lista de maldades saídas dessa caixa de pandora é tão grande que dá vontade de querer voltar à época em que nossos antepassados só gruíam, gritavam e gesticulavam; guerreavam apenas com punhos, pedras e porretes de pau.

terça-feira, junho 01, 2021

A FILOSOFIA DE USO, UM SABER DE USO

 


 

Nosso esforço é o de resgatar o sentido antigo de filosofia, que é o do amor a sabedoria, e que esse amor à sabedoria pode ser a forma de se alcançar uma maneira de viver o mais saudável possível, tanto física e social, quanto mental. Entendemos que essa foi a missão de Sócrates, o filósofo de rua da antiguidade grega, que dedicou sua vida a beliscar os outros para que procurassem por si mesmos o “saber viver”.

 

Só não é nosso propósito criar uma ideologia, uma interpretação fechada e completa da vida, mas, sim, estabelecer um filosofia de vida, formada por um conjunto complexo de  comportamentos filosóficos.

 

Resumindo: uma maneira filosófica de viver.

 

Mas o que é uma maneira filosófica de viver? Essa postura pode ser definida práxis de vida, praticada por meio da reflexão, da inspeção detalhada de cada questão, da análise antes de qualquer julgamento - seja ele moral ou técnico - uma análise, em fim, que não busca a explicação mas o conhecimento da  coisa. Para cada fenômeno eu pergunto o que é isso e não como explicar o que é isso?

Ao longo da história da humanidade, buscaram-se explicações. A era da ciência suspendeu a explicação antecipada ou justificadora das coisas e passou a destrinchar, investigar os fenômenos e conhecê-los no que são, independente de qualquer crença, explicação ou julgamento.

Assim, em nossa busca do saber de uso, ou seja, do saber para uso prático da vida, essa busca só dará resultados para aqueles que estiveram aquém ou além das explicações e dos julgamentos peremptórios ou dogmáticos.

quarta-feira, maio 26, 2021

A IDEOLOGIA DO PASTOR DE OVELHAS

 

Sabe o que é mentalidade do “pastor de ovelha”?

É aquela ideologia que prega que o mundo é dividido em três classes: ovelhas, lobos e pastores.

Quem prega essa mentalidade é quem se vê no papel de pastor. Quem acredita nessa mentalidade é aquele que se sente fraco e impotente; este se agarra na crença de que o pastor o protege dos lobos. As ovelhas vêem o pastor como protetor, mas não percebem que só valem alguma coisa enquanto servirem para lhe dar lã que o protege do frio e carne para matar sua fome. Quando não há predador o pastor inventa lobos para não perder seu posto privilegiado.

quarta-feira, maio 12, 2021

NÃO SE NEGA A VIDA IMPUNEMENTE

 Quem leu Nietzsche e não apreendeu a mensagem principal de seus escritos que é a de que ”ninguém nega a vida impunemente”, não aprendeu nada. Abraçar a utopia de que a vida é amor, solidariedade, cooperação, pacifismo, harmonia com a natureza e altruísmo extremo é a forma mais vulgar de negar a vida e, por conseguinte, de sacrificá-la. O ser humano não é santo, mas também não  é demônio, não é guerreiro o tempo todo ou pacifista em qualquer circunstância. Sonhar com um mundo cor de rosa leva ao risco de querer transformá-lo em cor única, monocromático, eliminando todas as outras cores, e esse é o primeiro passo para se destruir a vida verdadeira.

quinta-feira, abril 29, 2021

HIPERATIVIDADE MENTAL E BOM HUMOR

 Quando se estuda a história da filosofia, é uma constante o problema enfrentado pelos pensadores em função de nosso cérebro hipertrofiado. Pensamos demais, trazemos o passado e imaginamos o futuro. Se nosso passado foi trágico, projetamos um futuro tenebroso. Estamos presos nesse desespero da mente hiperativa. Sair dessa armadilha foi, historicamente, muito difícil e raro. Poucos homens conseguiram conviver com o ritmo frenético de seus pensamentos. Esses poucos indivíduos que conseguiram conviver com a hiperatividade mental e dar-lhe um rumo construtivo e fecundo, eu os chamo de sábios. 

Adoro o sábio que ri. Os humoristas estão, quase todos, de bem com a vida; em vez de ver o lado trágico da vida passada, presente ou projetado no futuro, eles encontram e cultivam o lado cômico das coisas. Há! como é bom rir da estupidez humana e, principalmente, da nossa própria estupidez. Um indivíduo alegre e bem humorado nunca será candidato a ditador.

quarta-feira, abril 21, 2021

HÁ MOMENTOS DE.....

 Há momentos de competir e há momentos de cooperar;

Há momentos de plantar e há momentos de colher;

Há momentos de pratear e há momentos de regozijar;

Há momentos de trabalhar e há momentos de descansar;

Há momentos de juntar e há momentos de espalhar;

Há momentos de falar e há momentos de calar;

Há momentos de lutar e há momentos de selar a paz;

Há momentos de acreditar e há momentos de duvidar;

Há momentos que se perde e há momentos que se ganha;

Pois  saber o momento de cada coisa é o principio da sabedoria.

quarta-feira, fevereiro 17, 2021

SÓCRATES ENSINAVA HUMILDADE

 

Numa manhã de chuva, daquelas que persistem todo o dia, resolvi voltar a ler sobre Sócrates. Da janela podia ver as árvores da mata e suas folhas molhadas, oscilando sob o impacto das gotas d’água. Meu desejo era imaginar a mim mesmo, apoiado nas informações que temos e nos escritos que chegaram até nós, perambulando pelas ruas poeirentas de Atenas num dia qualquer do alto verão. Encontraria Sócrates sentado num banco de pedra, à sombra  das árvores  e conversando com seus amigos. Pelos relatos, sua aparência era inconfundível.

 

Sócrates admitia que seria incapaz de ensinar qualquer coisa a alguém, principalmente por dinheiro. Na apologia cita o caso de Cálias de Hipônico que admitiu que iria pagar 5 minas para Éveno de Paros, para educar seus filhos. Ouvindo isso Sócrates declarou: “o certo é que eu também me sentiria altivo e orgulhoso, se soubesse tais coisas (capaz de vender ensinamentos); entretanto, o fato é que não sei”.

 

 

Uma idéia revolucionaria de Sócrates até hoje ainda não foi assimilada pelo povo, ou pelo menos nunca foi posta em prática, seja pelos intelectuais, seja pelos políticos, seja pelos mestres e ensinadores. É a de que sábio é aquele que sabe até onde sabe e que consegue imaginar o quanto ainda não sabe. Sábio é o relativista que se preocupa não com o que aprendeu, mas com o quanto precisa aprender para poder formular alguma regra ou conceito válido ou útil.

 

Sócrates percebeu, já faz mais de dois mil anos, que as pessoas especialista em alguma área do conhecimento se sentem sábias em qualquer outra coisa,  e assim são consideradas pelos outros. De vez em quando vemos grandes cientista manifestando opiniões sobre disciplinas que desconhecem. O povo acha que um médico notório no seu saber e com habilidade cirúrgica é também hábil em política ou psicologia. Este equivoco persiste intacto nos tempos atuais.

Ou seja, as pessoas não conhecem os limites de seu conhecimento ou de sua inteligência e portanto, conforme Sócrates, não são sábias.

sexta-feira, novembro 08, 2019

DIÁLOGO IMPOSSSÍVEL



 Alguem acredita que é possível dialogar com um bárbaro?
Olhe, eu não avalio as pessoas pela cor da pele. Mas não dá para negar que a sociedade é composta de brancos, negros, pardos, asiáticos.
- Viu como você é racista, seu branco opressor!
- Como assim?
- Você é racista, racista, racista!!! Gente esse cara aqui é um racista!!!!!

terça-feira, agosto 20, 2019

TROPEÇANDO NOS MEUS CHINELOS


A relação entre pensamento e vida, entre as idéias que o ser humano cultiva e a vida concreta, entre as reflexões filosóficas da vida e do mundo e o dia a dia do cotidiano, como trançar todos esses laços? Não afastar da vida do meu chinelo, dos meus filhos, dos meus pais, dos meus amigos, dos meus inimigos, dos meus vizinhos, mas levar para esse mundo o que encontro nos livros, nas teses filosóficas, nos tratados sociológicos e nas idéias de pensadores do passado, depois trazer de volta esse adubo e fertilizar o  mundo concreto de meus desejos, de anseios e das minhas relações sociais, enriquecendo a mente e clareando os próximos passos. Isso é  possível?

Como posso aprender a viver, gastando a maior parte do tempo na luta para manter-me vivo? Nalgum momento da vida meu pão de cada dia pode estar assegurado, mas o alimento da mente não corre risco de faltar? Como exercitar o cérebro assim como se levanta pesos em uma academia para fortalecer os músculos?
Outro dia, depois de ler uma volumosa biografia de Benjamin Franklin, desejei passar alguns dias sem ler outro livro e folhear, por algum tempo, os meus próprios neurônios agitados e, talvez, observar as idiossincrasias dos amigos e dos políticos. Exercitar a mente viajando ao passado tende a enfraquecer minhas pernas. Corro o risco de tropeçar na realidade do que se passa a volta. Quero comentar aquela leitura, mas deixo para outra ocasião, pois meu pensamento agora quer desenvolver músculos por outros meios, como observar pássaros no alto da montanha ou tirando um tempo para conversar com amigos e parentes.
A preocupação é a de não deixar que os contornos musculares do cérebro se atrofiem por falta de atividade. Decidi, por alguns dias, ler o “livro aberto da vida” para concluir com uma frase de poesia barata.


quarta-feira, novembro 07, 2018

COMPORTAMENTO APROPRIADO


No sentido extramoral qual é o comportamento mais adequado para o momento? Quando o adequado é lutar, luta-se com o máximo de energia possível e com a maior habilidade adquirida; quando é adequado fugir, foge; quando for adequado fazer as pazes e celar um acordo, escolhe-se a paz e celebra o acordo. Esse é o comportamento apropriado.

quarta-feira, março 21, 2018

O QUE HERDAMOS DE NOSSOS ANTEPASSADOS?


Nossos pensamentos e crenças herdadas estão de tal forma entrelaçados com os sentimentos que se torna quase impossível modificar essas crenças e formas de pensar independentemente dos sentimentos e afeições. Da mesma forma, não se consegue separar os sentimentos das crenças e pré-conceitos inconscientes que moldaram todo o nosso ser e que geram, numa sociedade qualquer, formas de ver e pensar o mundo muito semelhantes, estabelecendo uma certa homogeneidade social positiva ou mesmo negativa.
                                                                                                                      
 Costumo imaginar que sou um processo sem começo determinado, um ponto na linha do tempo histórico. Sou produto do passado, fruto das escolhas que meus pais fizeram. Estes por sua vez são conseqüências dos atos e escolhas de meus avós.  E assim pode-se retroceder até ao verme de quatro bilhões de anos atrás. Somos efeitos de causas passadas e as causas passadas eram efeito de causas anteriores e assim retrocedendo-se indefinidamente.
Não será por isso que notamos uma certa continuidade nos costumes a que chamam de “característica de um povo”, ou seja, costumes, hábitos, qualidades,  defeitos, vícios, independentemente de leis, códigos, coerções, revoluções, matanças e religiões?

sexta-feira, janeiro 19, 2018

ONDE SE APRENDE A VIVER UMA BOA VIDA?

Uma sociedade simples como uma aldeia indígena que não possui normas escritas de comportamento funciona melhor que uma sociedade moderna baseada em leis e penalidades; por que acontece assim?
Esse tipo de sociedade está fundamentada sobre costumes e hábitos transmitidos de geração para geração através da imitação e do exemplo paterno. É um sistema de educação não institucionalizado, não planejado por um grupo especial de membros ou por um projeto de vida escolhido pelos pais. As pequenas dissidências são condenadas de forma suava pelos outros membros da sociedade, de forma que o membro desviante se sente coagido a mudar seu comportamento em resposta a reação negativa da comunidade.
Nas sociedades regidas por leis modernas essa educação básica e fundamental é desprezada em nome da educação estatal, planejada aplicada com objetivos políticos.
Destacar:  desprezamos a educação por imitação, pela relação social e investimos na educação controlada, ou com o objetivo de controlar cada indivíduo, como se ele fosse moldável, não pelo processo de assimilação mas por meio de impossições.
Assim como temos médico para cuidar da nossa saúde, advogado para nos ajudar a prevalecer sobre os outros, psicólogo para fazer nossa cabeça, temos também professores para nos ensinar comportamentos. O comportamento do professor ou da professora não é exposto ao aprendiz e sim separado do contexto do ensino. O que o professor é disvincula-se do que ele ensina, assim como não interessa ao tratamento médico se o doutor é um bom marido ou um bom pai. É preciso, apenas, que ele seja um bom especialista em medicina.
Qual é o resultado dessa separação, dessa desvinculação?
A vida real tem aspectos tão separados e independentes? Será que um médico para ser bom médico não precisa ser um bom marido, um bom pai ou um bom membro da sociedade?
Da mesma forma um professor está desvinculado, no ambiente de ensino, dos aspectos sociais da sua vida. É possível ensinar dessa forma?
Outra questão é que o professor não considera ou ignora a educação que a criança está tendo em casa no seio da família e desvincula esse aspecto da formação do indivíduo. Muitas vezes o que a criança ouve ou é ensinada a praticar pelo professor revela-se o oposto do que vê e ouve em casa.
A educação é compartimentada, sem distinguir entre ensinar habilidades manuais ou técnicas científicas e ensinar a viver.
A arte e a ciência de viver é enfiada guela abaixo do aluno como ser fosse a mesma coisa que ensinar como desenhar, ou como funciona um motor de carros. A engenharia de viver é ensinada como extensão da engenharia civil ou mecânica.
Daí que os avanços das chamadas ciências exatas foi prodigioso nos últimos séculos e os avanços nas “ciências humanos” foi insignificante.
No processo de ensinar uma habilidade manual temos: explicação – demonstração – imitação e prática pela repetição.
No processo de ensinar a viver bem temos outra forma de aprendizado: observação – avaliação por comparação – imitação e prática pela repetição.

No aprendizado técnico o professor pode ser ignorado como ser social, pois está ensinando uma prática que não envolve comportamentos afetivos diretamente. Já no aprendizado da ciência de viver, os aspectos afetivos do ser humano são o ingrediente básico do ensino.  Nesse caso o que o professor diz tem menos importância que o que ele faz na sua vida particular. Não será por isso que as escolas ensinam comportamentos de maneira insistentes e, no entanto, as pessoas saem da escola como se nada tivessem aprendido?

quarta-feira, maio 24, 2017

TRANÇANDO LAÇOS E RELAÇÕES

A relação entre pensamento e vida, entre as idéias que o ser humano cultiva e a vida concreta, entre as reflexões filosóficas da vida e do mundo e o dia a dia do cotidiano, como trançar todos esses laços? Não afastar da vida do meu chinelo, dos meus filhos, dos meus pais, dos meus amigos, dos meus inimigos, dos meus vizinhos, mas levar para esse mundo o que encontro nos livros, nas teses filosóficas, nos tratados sociológicos e nas idéias de pensadores do passado, depois trazer de volta esse adubo e fertilizar o  mundo concreto de meus desejos, de anseios e das minhas relações sociais, enriquecendo a mente e clareando os próximos passos.
é  possível?
Como posso aprender a viver, gastando a maior parte do tempo na luta para manter-me vivo? Nalgum momento da vida meu pão de cada dia pode estar assegurado, mas o alimento da mente não corre risco de faltar? Como exercitar o cérebro assim como se levanta pesos em uma academia para fortalecer os músculos?
Outro dia, depois de ler uma volumosa biografia de Benjamin Franklin, desejei passar alguns dias sem ler outro livro e folhear, por algum tempo, os meus próprios neurônios agitados e, talvez, observar as idiossincrasias dos amigos e dos políticos. Exercitar a mente viajando ao passado tende a enfraquecer minhas pernas. Corro o risco de tropeçar na realidade do que se passa a volta. Quero comentar aquela leitura, mas deixo para outra ocasião, pois meu pensamento agora quer desenvolver músculos por outros meios, como observar pássaros no alto da montanha ou tirando um tempo para conversar com amigos e parentes.

A preocupação é a de não deixar que os contornos musculares do cérebro se atrofiem por falta de atividade. Decidi, por alguns dias, ler o “livro aberto da vida” para concluir com uma frase de poesia barata.

terça-feira, dezembro 06, 2016

NOSSA VIDA NÃO TEM CAMINHO

Caminhos e estradas são muito simbólicos e servem para criar metáforas de todo tipo. Dizem que viver é seguir um caminho. Quando a pessoa comete erros, consideram que perdeu o caminho ou o rumo. Não consigo imaginar como é esse caminho nem quem o abriu para mim. Alguns dizem que  viver é seguir por essa imaginaria estrada até encontrar a morte. Outras pessoas dizem que, se seguirmos certas regras obrigatórias, ao final dessa viagem alcançaremos o paraíso. Claro que uma boa parte acaba indo é para o inferno. 
Acho bastante interessante essas metáforas, pois simplificam muito a nossa necessidade de encontra uma  lógica ou uma razão do viver.
Mas, será que não estamos sendo enganados com isso? A metáfora da vida como um caminho a percorrer dá a ilusão de que existe um sentido prévio da  vida, uma espécie de missão impostas a todos as pessoas. Dizem até de que há, numa determinada etapa desse caminhar, uma encruzilhada. Para a esquerda vamos direto a um mundo sustentado pelo diabo. Para a direita, podemos alcançar o céu, povoado de anjos imaculados e com um chefe todo poderoso chamado Deus. 
No cotidiano de nossas vidas essa metáfora, embora não seja nada prática, nos segue como vulto ideal, uma espécie de bússola que nos orienta ao longo da acidentada jornada
 Por atrevimento ou, talvez por imprudência, resolvi imaginar como seria minha vida sem essa metáfora. Considerei que viver pode ser um caminhar, mas sem nenhuma vereda, nem uma trilha sequer. Teria que viver abrindo minha própria trilha em meio às florestas das possibilidades, de desafios, de obstáculos e das necessidades de escolhas. Preciso, toda, desbravar uma parte desconhecida, uma subida penosa e cheia de pedras ou uma descida inclinada demais, escorregadia e ponteada de valas e cercada de despenhadeiros. Posso encontrar, à frente, pântanos perigosos ou desertos inclementes. De qualquer forma minha caminhada não pode ser detida a não ser pela morte. E, como desejo continuar bem vivo, não desisto e prossigo. Imagino que não há bússola nem outros meios confiáveis de me orientar. Sigo em frente meio perdido, desorientado ou caminhando em círculos. Depois consigo encontrar meu rumo e recobrar o animo de prosseguir. Atrás de mim, fica o caminho, as marcas das solas do sapato e os galhos e cipoais rompidos à minha passagem. À frente, não vejo sinais de  de outros, rastros de algum viajante mais prudente, só arbustos espinhosos, liames enovelados entre os troncos das árvores, ou charcos traiçoeiros. Quando passo pelo deserto, só vejo areia, pedras, e o brilho do sol abrasador. Passo fome, passo cedo, sinto fraquezas, as vezes desânimos ou desespero, mas tenho que prosseguir. Depois que passo, fica o caminho, as marcas de minhas obras, das escolhas e dos atos. Um caminho que depois o tempo vai se encarregar de devolver à natureza e apagar as pegadas de minha passagem. 

quinta-feira, novembro 10, 2016

BOAS INTENÇÕES SÃO O CAMINHO MAIS CURTO PARA O INFERNO

Muitos acreditam que consertar o mundo e construir o paraíso perfeito é uma questão de vontade obsessiva de alguns e de subordinação de todos os outros; ainda, da eliminação direta dos contrários e com o triunfo da unanimidade.

Tem gente que acredita que o mundo só é imperfeito e sofrido por culpa dos outros. Caso esses outros aceitassem suas idéias e se dispusessem, pacificamente, a lhes obedecer, rapidamente o paraíso se estabeleceria na terra. A complicação é que esses “outros” pensam a mesma coisa daqueles primeiros.

terça-feira, outubro 04, 2016

QUANDO É POSSÍVEL SER CULTO?

Imagine alguém que vive na roça, na zona rural, longe de cidade, aquele que tira  seu sustento da terra. Talvez crie galinhas, porcos e gado leiteiro. Num mundo isolado desse estaria ele obrigado a  viver uma vida mentalmente pobre, absorvido em sua lida e sem tempo para ler um livro, conversar com gente culta, ouvir palestra sobre economia, quem sabe psicologia ou mesmo filosofia? Porque o lavrador deveria viver de seu trabalho assim como vivem as abelhas na coleta de néctar, com conhecimento suficiente da posição do sol, da direção do vento ou dos ciclos das estações? Não poderia ele adquirir musculatura mental assim como adquiri calos nas mãos e hipertrofia os músculos dos braços? Estaria condenado a aprender meramente datas para plantar couves,  ou qual a melhor época para semear feijões, decorar as fases da lua, dos dias de festas no povoado e da  missa na igreja de pau à pique?
Qualquer homem da roça sabe distinguir as primeiras folhas do milharal que nasce das brotas de capim ou de ervas daninhas. Mas sabe ele distinguir uma sonata de Beethoven de uma peça de Mozart, ou ainda, que o cavalo de tróia era de madeira e que a montaria  de Alexandre tinha o nome de bucéfalo?
Parece-me que em quase todas as partes do mundo, ser agricultor é sinônimo de vida tosca, embora romântica. Justamente aquele indivíduo que vive em contato com a natureza, ver todos os dias os pores de sol e todas as auroras, pode terminar por não perceber a beleza das nuvens formando fantasmas de roupas brancas e amareladas, contornadas por  bordas vermelhas. Talvez, por isso mesmo, por ter todas as manhas e todas as tardes defraudando arrebóis encarnados, que tudo acaba sendo sem importância. O homem não olha para o céu, nem perscruta o horizonte a não ser para ver se vem chuva ou se o dia vai ser quente.
Só quem perdeu todo  esse paraíso é que aprende a valorizá-lo. Aquele que vive entre fumaça de automóveis, horizonte bloqueado por arranha-céus, ruas coalhada de gente e de ruídos de trens e fábricas, pode, de uma hora para a outra, refugiar-se no meio de uma invernada ou no sopé da montanha. Então ouvirá o burburinho da correnteza do rio, o canto dos pássaros e desejará admirar o sol que desce deslizando sobre o morro irregular e escuro, e aí irá se emocionar e exclamar: como é belo!
O triste é que a vida no campo está associada à vida simples, pobre, ingênua, sem graça e vazia. Em minhas caminhadas pela borda da floresta ou atravessando rios a nado, lembrava que por conhecer os dois mundos, aprendi a buscar não só prazer no meio do “nada” como fazer desse nada, desse mundo de plantas, pedras, animais, insetos, um universo não só emocionante mais também cheio de belas e agradáveis surpresas. Quando me exercitei na lida de agricultor e ganhei o meu pão de cada dia plantando abóboras e alfaces, meu objetivo era não só o de cumprir um ritual de que tinha saudades como o de poder plantar feijão e depois ler Homero, saboreando a ambos com o mesmo prazer. Acreditei até que plantar uma roça de milho é tão filosófico, tão criativo quanto escrever uma tese sobre Spinoza ou descrever numa monografia as contradições da teoria da relatividade comparada à mecânica quântica.

De qualquer forma a maioria dos roceiros parece feliz e não sente falta de Aristóteles, de Spinoza, de Descartes e suas vidas. Os biólogos e os antropólogos dizem que os seres vivos adquirem conhecimento de seu meio como estratégia de sobrevivência e nada além do que precisam para manter-se vivos e se reproduzirem. Nesse caso alguns seres humanos fogem à regra, pois estão sempre se metendo em confusão, seja ela religiosa ou filosófica. Querem conhecer mais do que plantar trigo ou fugir de raios nas tempestades. Mas os lavradores que conheci estão mais de acordo com as explicações dos biólgos. A maioria vive feliz com seu mundo simples e delegam aos deuses e santos as tarefas que demandam conhecimentos ocultos ou difícil de serem adquiridos, já que seu mister não o exige, ou pelo menos assim acreditam.
Invejo essa simplicidade da vida campesina, marcada pelo contato direto e muito próximo com o mundo natural, quase inteiramente dedicada aos instintos de sobrevivência e a procriação. Pelo menos não sofrem a angustia daqueles intelectuais que perderam a inocência de viver, enroscados em tantas perguntas sem respostas. Cultivam certas preocupações que são boas  para provocar insônias.


Certa feita, fui a um velório no sertão e, como todo observador ressabiado, fiquei observando e ouvindo os presentes. O que notei foi uma total falta de medo da morte. Todos desejavam que o defunto descansasse em paz como se por toda a sua vida não tivesse encontrado momentos de repouso. Tinham uma visão quase fatalista da vida e da morte, ou melhor, viam a vida como constante labuta e a morte como aquele momento de repouso, o descanso sem volta, o alivio das dores e suores da existência.  Pelo menos não percebi neurose nessa filosofia tosca e resignada, em certo aspecto melhor que a minha. 

quinta-feira, agosto 25, 2016

FLORES SEM NOME

O quintal de qualquer casa está sempre sendo invadido por plantas, a maioria desconhecida, que chamamos de mato. 

O lavrador dá o nome de praga da roça.







Meu quintal não é diferente. Uma dezena de plantinhas nasceram e cresceram enquanto não tinha tempo para limpar o terreno. Algumas começaram a soltar flores e eu parei para admirá-las. Não eram plantas de jardim ou ornamentais, mas tinham pétalas lindas e não deixavam nada a desejar às rosas, aos cravos e as orquídeas.



Fiquei contente de não tê-las capinado.

quinta-feira, junho 09, 2016

VIAGEM COM POUCO DINHEIRO

Viajei para Itahum para conhecer a região. Levei dinheiro para comer alguma coisa por três dias e guardei o suficiente para pagar a passagem de volta à Itaporã. Não tinha sobra para ficar num hotel. Perambulei pela cidadezinha por algumas horas, comi um lanche simples num barzinho aconchegante e segui para os arredores. A cidade era  cercada pelo cerrado, terreno plano, arreia clara e árvores pequenas e esparsas.  Procurei uma parte deserta e calma para passar a noite. Com o cair da tarde, escolhi um local limpo, arenoso, com árvores retorcidas e moitas de capim barba-de-bode. Entre os ramos e touceiras destacava a superfície de areia muito fina, partes amarelo-amarronzado e  outras muito brancas. Lembrava um deserto só que mais vivo, mas verde e cheio de vida. Por um momento observei os pequenos lagartos correrem de um lado a outro e formigas perscrutarem as cascas das árvores. Era fim de tarde e um vento fresco começou a substituir o calor intenso do dia. Sentei-me no chão e abri minha mochila, disposto a escrever alguma coisa no meu caderno de anotações. Peguei a caneta, mas nada me vinha a mente. Aliás, uma multidão de coisas agitava minha imaginação, e nenhuma daquelas imagens associadas a sentimentos de toda sorte, demorava mais que alguns segundos. A luz diminuía constantemente.
Pensei comigo: vou dormir por aqui mesmo; quero alimentar-me dessa visão agreste por mais tempo. O terreno era incrivelmente regular e o horizonte parecia muito próximo. As pequenas árvores afastadas umas das outras balançavam delicadamente suas folhas ao toque da suave brisa do cair da tarde. Não lembro, exatamente, o que sentia. Tenho certeza apenas de que uma centena de sentimentos, misturados com visões coloridas e brilhos de luzes desconhecidas, tumultuavam minha cabeça. Mas era uma sensação gostosa, talvez uma embriaguez prazerosa. Pássaros silenciosos saltitavam por entre touceiras de capim, juntamente com as formigas e os lagartos apressados. Uma seriema piou ao longe, a oeste; outra respondeu, ao norte.
Passei a noite meio sentado na areia, as pernas, ora esticadas ora encolhidas,com as costas apoiada no tronco rugoso de uma árvore de folhas oblongas e ásperas.  Ouvi muitos ruídos que me assustavam, uivos e guinchados mais distantes que me obrigavam a abrir os olhos e a perscrutar a escuridão. A noite era relativamente clara, sem lua, mas com um céu tão cheio de estrela que elas pareciam mais baixas, mais próximas da terra. Tinha a sensação de que se levantasse, esticasse o braço para cima, poderia tocá-las.  De manhã, quando o brilho vindo do leste estendeu-se pelo campo, desejei agitar meus membros doloridos e caminhar na direção do meu destino.


segunda-feira, abril 25, 2016

RELIGIÃO E CIÊNCIA E A SUPERAÇÃO

CAPÍTULO AINDA SEM NÚMERO

Versículo 121 – Os seguidores de religiões cultivam a fé porque ignoram que a dúvida não mata. Se não temessem a morte, nem os demônios, nem a fúria dos deuses, não receariam de mandar antecipadamente seus padres, pastores e gurus para o inferno, mesmo sem acreditar no inferno.

Versículo122 – Qualquer religião que se preze precisa ter belos e suntuosos templos. Seus deuses são tão humanos que precisam de palácios, luxos e conforto; os súditos devem descalçar os pés e pôr-se de joelhos nesses lugares  sagrados. Precisam demonstrar algum tipo de submissão e obediência.

Versículo 123– Não podemos comprovar a inexistência dos deuses, embora as divindades que conhecemos são demasiadamente humanas para perdermos tempo com elas.

Versículo 130 – Quem condena as religiões não entende o papel que elas desempenham. São respostas provisórias para perguntas que ainda não tivemos coragem de fazer. São explicações de um mundo que ainda não aprendemos a suportar.

Versículo 131– Religião religa o ser humano ao mundo da natureza da qual nunca se desligou por absoluta impossibilidade, mas de que se sentia diferente e separado. Talvez por ter a capacidade de construí-la dentro do cérebro e isso causava tamanho terror que precisava domar, não a natureza que estava fora de si, mas a que havia construído dentro de si. A natureza dentro de si não podia ficar sem explicações, sem causa e efeito compreensível. Por isso que a ciência é uma continuidade da religião que substitui o dogma e a explicação arbitrária pela hipótese e pelo experimento; de certa forma a ciência não destrói a religião, vai além dela. Na verdade dá continuidade ao objetivo de diminuir o terror que o desconhecido, a mudança e o futuro incerto causam no ser humano


Versículo 132– O medo do trovão e do raio não era medo do trovão e do raio; era medo do poder do trovão e do raio. O ser humano precisava saber a natureza do trovão e do raio para poder, de alguma forma, descobrir um meio de evitá-lo ou domá-lo. Dizer que o trovão e o raio eram a manifestação do poder de um Deus qualquer foi o recurso inventado, primitivo e tosco, na tentativa de domá-lo. E aí estava o germe da ciência de hoje. 

segunda-feira, março 21, 2016

OS DETALHES DA FLORESTA


Estava observando o terreno perto das árvores, numa parte plana onde tenciono fazer alguns canteiros de verduras. Sempre admiro o viço das plantas, principalmente no verão, quando uma área limpa se cobre de mato e em pouco tempo cresce e logo ameaça transformar o que era antes uma terra exposta ao sol, novamente em mata. Num metro quadrado contei mais ou menos 35 tipos diferentes de plantas. Se deixar, passado alguns meses o mato já tem o tamanho de meio metro de altura.
Quando voltei para dentro de casa, vi que as pernas da minha calça estavam repletas de sementes que haviam aderido ao tecido de forma tão forte que precisei usar a unha para tirar uma a uma. Todo mundo sabe que muitas plantas criam mecanismos de semeadura extremamente sofisticados e desenvolvem pêlos na superfície das sementes para que algum passante, seja gente ou animal, arraste essas para longe, garantindo a disseminação e a perpetuação da espécie. Um caso clássico de semente que se agarra nas calças e peles das pessoas são os popularmente conhecidos "carrapicho" e "picão".
Todo  a imensa diversidade de artimanhas que as plantas usam para, primeiro viabilizar a fecundação, o cruzamento entre machos e fêmeas, usando aves, animais, insetos e o vento.
Depois vem o encanto dos recursos para viabilizar a disseminação, espalhar seus óvulos que são as sementes, da mesma forma usando os animais, as aves, os insetos e o vento.
Desse caso eu quero tratar aqui.
Na verdade é uma viagem instigante observar os mecanismos que as plantas usam para se disseminarem. Nunca me canso de estudar esses detalhes da natureza, tanto na variedade de recursos como nas miríades de formas extremamente criativas de propagarem seus descendentes. Como as plantas não andam nem podem criar seus descendentes assim como fazem os animais, dependem dos outros para se reproduziram. Só as inumeráveis maneiras de desenvolver soluções aerodinâmicas, atrativas ou adesivas já encantam quem tem a paciência de observar não só as grandes paisagem mas também os pequenos, as vezes quase invisíveis, detalhes dos sistemas de reprodução das plantas. Outro dia peguei uma semente de cedro, uma pequenina vagem com pestanas quase transparentes. Esse tipo de asa  serve para que, quando ela cai lá do alta da copa, o vento a leva para longe. Essa usa o vento, outras usam o apetite das aves e dos animais, outras usam coberturas adesivas como aquelas  que descrevi no inicio. As que desenvolveram cobertura comestível, também criaram cores chamativas e um núcleo resistente ao processo de digestão de animais e aves. Dizem os botânicos que certas sementes só nascem depois de passar pelo ataque do ácido do trato digestivo dos mesmos. O cedro que citei, como se sabe torna-se imensa árvore de 20, 30 metros de altura, mas sua semente é muito pequena e pesa somente algumas gramas. Mas, naquela minúscula semente armazena todas as informações de que precisa para nascer, desenvolver e se reproduzir.  Podemos dizer, meio grosseiramente, que cada semente é um micro-chip, contendo os dados genéticos e a programação de reprodução da árvore mãe.
Outro detalhe curioso é a abundancia de sementes que são produzidos anualmente por uma árvore. É coisa assombrosa. Contei o cacho de uma palmeira juçara e havia 456 coquinhos. Quando os plantei 80 por cento deles nasceram. E essa palmeira solta até quatro cachos por ano. Para não correr riscos, a natureza prefere exagerar na reprodução de seus descendentes. Uma figueira brava, por exemplo, dá tanto fruto que é praticamente impossível contá-los.
Essa superabundância de frutos não só garante a perpetuação de cada planta como garante o alimento de miríades de pássaros, aves, animais e do próprio homem. O que seria da humanidade se não houvesse essa abundância de grãos, frutas, legumes e castanhas?

Naturalmente qualquer um de nós chega a conclusão de que a vida não só é interconectada em seu conjunto biológico, quanto interdependente em sua troca de favores e de  dependências.

quinta-feira, março 10, 2016

VOLTA DOS MILITARES? SÓ OS DESMIOLADOS PEDEM ISSO

Se existe alguma coisa nesse pais que está sempre em falta e não é fornecido pelo estado é bom senso. Clamar pela volta dos militares é um absurdo tão grande de não consigo entender quem defende essa solução par eliminar o PT do poder. Os milicos tiveram 20 anos para erradicar o Brasil dos vermelhos e não conseguiram; eles voltaram mais forte do que nunca. O regime militar estupido e sem rumo, não teve a capacidade de consertar o país. Quando a batata esquentou jogaram ela no colo do comunas e em menos de vinte anos levaram o poder e os milicos humilhados, tratados à pão e água, mantiveram o rabo no meio da pernas e engoliram seco. Se os militares tivessem, pelo menos, um pouco de crença na liberdade, que é a única forma de um pais prosperar e eliminar a miséria, poderiam ter feito como Pinochet que trouxe uma equipe da Universidade de Chicago e deu rumo ao pais. Lá a esquerda mesmo quando conquista o poder não consegue mudar o legado dele. Pelo menos por enquanto. Hoje é um pais próspero. Os nossos militares arruinaram o pais, trataram os esquerdistas com luva de pelica, mataram o quê? duas dezenas deles, agoram tem que aguentar desaforo desses vermelhos, de bico calado. Vide a tal Comissão da Verdade. Pinochet eliminou milhares, alguns dizem que passaram de 20 mil, mas pacificou o país, deu rumo à sua economia, enquadrou os sindicatos e privatizou a previdência.
Repito, nada, na história do Brasil supera tanto incompetência, truculência e falta de cérebros como o regime militar. Portanto meus pesâmes aos que querem a volta dos militares, pela anemia dos neorônios ou pela leitura errada da história do Brasil

segunda-feira, fevereiro 29, 2016

A ESPIRITUALIDADE QUE NOS RESTA

Muitos  povos, como os egípcios da época dos faraós, adoravam o sol e o consideravam um Deus. Para esses povos, o fato de o sol todos os dias surgir no horizonte, expulsando a escuridão da terra, banhando os campos com sua luz dourada e quente, fazendo crescer as plantas e abrir as flores, só podia ser uma ação divina. Essa visão mágica dos fenômenos naturais tinha encanto e espiritualidade, sentimentos que as civilizações modernas não podem perder, sem que tenham enormes prejuízos psicológicos e sociais. A crença numa divindade atuando na natureza, como que cultivando os prados e  as florestas, assim como o ser humano faz com suas lavouras, era uma visão que envolvia mais que crença ingênua e mágica dos fenômenos físicos; respondia, também, a uma angustia espiritual diante das forças imprevistas das tempestades, dos terremotos e da cruel e permanente luta pela sobrevivênci. Afinal nossos antepassados viviam cercados por feras carnívoras e sob a fúria incontrolável da natureza.
Essa visão espiritual, o venerado respeito pela natureza, esteve presente na história da humanidade por longuíssimos períodos. É o que constatam os arqueólogos e sua incansável busca por registros ocultos pelas areias do tempo ou soterrados pela lama dos séculos. A humanidade deixou suas pegadas nessa aventura de milênios. Hoje eles escavam a terra e encontram vestígios de rituais, cochas, pedras buriladas, amuletos cizelados, colares, indícios de cultos às divindades naturais e até às feras da noite.
Mas hoje, sem religião, com a ciência descobrindo as razões e causas de todos os fenômenos naturais, não encontrando um deus ou uma força sobrenatural por trás das manifestações físicas, o que restará à humanidade?
Na verdade, a ciência não elimina o espiritual de maneira irreversível. Por que perderíamos a capacidade de admirar o poder do relâmpago, a beleza dos campos floridos, ou mesmo o encanto dos raios do sol passando por uma fresta das rochas enegrecidas da encosta da montanha? Entender porque o sol brilha, que há uma reação atômica em  seu interior cujo processo gera milhões de graus de calor e emite luz, não nos priva, necessariamente, de respeitar e admirar esse fenômeno fantástico de energia e força. Respeitar a natureza é compreender que apesar da enorme poder que a humanidade adquiriu com sua mente hiper-desenvolvida, ela não é capaz de alterar as leis da física, a velocidade da luz ou a presença da morte. A emoção e o prazer de admirar as flores da primavera não estão no mistério ou na ignorância das  leis da natureza; são características do  espírito humano e não se apagam com o conhecimento das mesmas e de como elas regem o universo. Pelo contrário, pode facilitar uma nova visão e gerar profunda reverência, em face dessas intrincadas e fantásticas leis. Afinal  somos, absolutamente, parte da natureza e não donos dela. Poderemos um dia saber quase tudo sobre ela, mas continuaremos sendo uma parte dela, e, se não a respeitarmos, ela nos varrerá da face da terra. 

sexta-feira, janeiro 22, 2016

PEPE O GAMBAZINHO CAMARADA

Os animais que não são domesticados são chamados de selvagens e normalmente as pessoas não tem nenhuma afeição por eles. Muitos sempre foram e ainda são caçados como alimento humano. Para piorar, com o acelerado desmatamento em toda parte, esses animais estão cada vez mais sem espaço para viver. Claro que para sorte deles, hoje há um forte movimento de preservação da natureza, o que trás alguma perspectiva de salvação para muitas espécies que caminham tragicamente para a extinção.
Mas um curioso e bastante misterioso animal tem desafiado as enormes mudanças que o meio natural vem sofrendo pela obra dos seres humanos e está aprendendo a, digamos assim, conviver com eles. Esse animal é o gambá, também conhecido por saruê.
Ficou comum encontrá-lo em forros de casas, caixas abandonadas no quintal, vãos de paredes e até em caixa de luz. Muitas pessoas imaginando ser ele um monstro devorador de gente, ataca-o furiosamente ou atiçam cães a matá-lo.
No entanto o gambá, cujas várias espécies foram agrupadas sob o nome científico de  didelfídeos, é um animal inofensivo e jamais morde muito menos come gente.
Outro dia apareceu em nosso quintal um filhote, debaixo da chuva, tremendo, quase sem forças para andar. Recolhemos o animalzinho e procuramos aquecê-lo o mais rápido possível. Minha companheira ficou encantada com o bichinho e o adotou de pronto. Deu-lhe o nome de Pepe e passou a, pacientemente, alimentá-lo com ovos batidos, frutas e ração para filhote de gato. Dormia o dia todo e mal acordava para comer. Em quatro semanas o gambazinho já estava esperto e assim que apagávamos as luzes da casa para dormir, ele começava a correr de um lado para o outro, a subir nos móveis e a entrar nas gavetas dos armários. Esperamos mais duas semanas e então resolvemos soltá-
lo, ou  melhor, deixá-lo escolher o mundo lá
fora.
Fizemos uma casinha forrada com panos felpudos e aconchegantes e a colocamos no sótão. Ali deixamos o bichinho para passar a noite. Pelo telhado havia passagens e uma janela sem vidros por onde ele podia sair e alcançar a mata que ficava a uns dez metros da casa. Por duas noites ele explorou todo o enorme sótão, mas não se aventurou a fugir. De manhã eu subia e ia direto à casinha. Abria o teto e o encontrava enrodilhado entre os panos, dormindo relaxadamente. Mas na terceira noite foi embora e não voltou mais. Gostamos de imaginar que vive por perto e a qualquer hora vamos topar com ele, andando pelo quintal no lusco-fusco da noite.


quarta-feira, dezembro 23, 2015

A LUA QUASE AZUL E CHEIA


 Na noite da última lua azul, 31 de julho de 2015, fomos para a sítio e ela nos acompanhou o tempo todo. Numa parte da estrada em que há matas de ambos os lados e algumas curvas acentuadas, reduzi a velocidade do automóvel, apaguei os faróis e dirigi por uns dois quilômetros só com as lanternas acessas, por segurança. Realmente havia uma cor azulada no ar, um tom esmaecido nos vultos de pedras, barrancos e árvores. Parecia que flutuávamos sobre a estrada.
A lua, própria, continuava cor de prata, mas, talvez, quem dera esse nome a ela - quando aparece duas vezes em um mesmo mês - tenha passado por igual experiência do tipo que passamos. Na realidade, o ar estava cinza azulado e, com o movimento do carro, os contornos da paisagem ora brilhavam ora ocultavam sob a sombra das matas. Foi alguns minutos, mas para jamais esquecer.
Lembrei-me, então, das crenças, lendas e cultos à lua, principalmente à lua cheia. Esses existiram desde a pré-história e entre praticamente todos os povos da terra. A lua sempre foi vista como mais misteriosa que o sol, talvez um pouco tímida, fria, mutante. Por isso ela é ligada às estações mais do que o astro rei. Simboliza também mudanças, o passar dos tempos, as fazes da menstruação feminina, por isso foi ligada à gravidez, à fertilidade. Na verdade a lua é um elemento essencialmente feminino na longa tradição de culto e veneração por sua presença e seus quatros estágios.
Na china há lugares apropriados para as pessoas visitarem a lua literalmente. Lugares altos, no cume de montanhas, onde as pessoas levantam os braços e sentem a sensação de que podem quase tocá-la. No oriente existem lugares chamados de “palácio da lua”, “bosque da lua cheia”, “montanha da lua”. Há até uma festa chamada de “bolo da lua”. Em Macau é um evento que se comemora até os dias de hoje.
A lua está ligada ao namoro, portanto ao amor, à saudade, simbolizando uma carga de sentimentos poéticos e de felicidade.
No interior do Brasil, quando ainda não havia energia elétrica, os dias de lua cheia eram ocasiões para os visinhos visitarem-se uns aos outros. Iluminados pela lua, tomavam as trilhas da roça ou do pasto, um atalho que sempre levava ao vizinho de cima, ou ao vizinho de baixo.
Os povos antigos cultuavam deusas que se confundia com o astro lunar e tinham papeis determinados a cumprir no meio dos humanos. Eram deusas da fertilidade ou protetora da caça, da mulher grávida, da criança, dos amantes. Para os gregos a lua cheia era a deusa Selene, para o romanos era Diana, para o babilônicos era Ishtar.
Os astrólogos ligam a lua ao fenômeno natural dos ciclos e das mudanças.
O mais óbvio e que influencia diretamente os seres humanos é a maré, provocada pela gravidade da lua.
Nas tradições de todos os povos a lua rege quase tudo na vida, desde o crescimento dos cabelos, o viço das plantas, ou a sorte e o azar dos seres humanos.


Eu, da minha parte, tirei a noite seguinte para sair para a divisa da floresta, sentar num tronco caído e relaxar, lavar o espírito com o banho daquela luz prateada e ouvir os ruídos do vento suave sobre as folhas e galhos das árvores mais altas. Os grilos pareciam mas animados e alguns vaga-lumes piscavam entre os troncos. Era uma  oportunidade de olhas a encosta do monte e ver tudo num tom cinza, quase preto e branco. As cores desaparecidas tornavam a paisagem estranha e quase irreconhecível. Não era bela, mas emotiva, meio romântica talvez.  

sexta-feira, novembro 27, 2015

CICLOVIAS E OUTRAS CICLOAVENTURAS




O povo paulistano, neste ano de 2015, sempre fala, com ironia, que tem um prefeito que é louco por ciclovias. Mas não vou falar desse sujeito que acha que sabe o que é melhor para os outros. Isso é gente perigosa para a sociedade. Os paulistanos fariam bem em não dormir sossegado, tendo um alcaide desses.
Mas desejo falar da bicicleta em si ou das virtudes de se aventurar por trilhas com esse veículo de duas rodas. Não acho graça nenhuma praticar ciclismo na cidade. Parece não só perigoso como nada recomendável à saúde. Respirar o ar poluído por automóveis é sacrificar os pulmões.
A bicicleta serve para fazer trilha de uma maneira bastante agradável, pois não gera ruído e possibilita ao amante da natureza rápidos deslocamentos que não é possível a pé.
Sempre gostei de trilhar a mata com mochila nas costas, pedalando relaxadamente uma bicicleta de 18 marchas.
Fazia um programa dessa natureza nos arredores da grande São Paulo, em lugares com muita mata, pedras, montes e riachos. Mas há regiões perigosas, principalmente aquelas próximas a vilas formadas por invasões. São áreas habitadas por gente pobre, distantes do centro, que aproveitam terrenos abandonados, proprietários ausentes ou desconhecidos. Pode ser inclusive áreas com restrições legais de construção, mas que, por descuido ou negligência das autoridades, foram invadidas e povoadas de um dia  para o outro. Esses lugares isolados e distantes acabam sendo esconderijo de fugitivos da lei e desocupados de toda espécie. Embora muitos desses moradores sejam gentes honestas e trabalhadoras, a ausência de autoridade facilita a presença de indivíduos que, se cruzarem com você, enxergará apenas uma presa fácil para roubar sua bicicleta e sua mochila, talvez até seu tênis. Aconteceu isso como um amigo e não desejo compartilhar com ele essa experiência.  
A última vez que perambulei pelas trilhas foi numa área distante de estratos urbanos e pude cruzar com um casal de capivara deitado na sobra junto ao córrego. Com a minha aproximação, os dois animais levantaram e saltaram na água, nadando para uma curva uma dezena de metros adiante. Vi muitas aves e pássaros. Parei numa parte alta do terreno, alertado pelo ruído estranho na copa das árvores. Olhei e vi um bando de bugios, saltando de um galho ao outro. Uma fêmea carregava seu filho nas costas. O macho, mais corpulento e com uma juba meio marrom, parou e me encarou. Olhei-o em silencio, sem fazer nenhum movimento. Acredito que percebeu que eu não era uma ameaça, pois virou lentamente e subiu pelo tronco mais grosso da árvore, saltou para outra galhada e se afastou, seguindo as fêmeas.
Mais tarde vi um veadinho saltar de um descampado para o mato e fugir quebrando ramos e contornando as pedras do meio da mata.
Na volta presenciei mais um gracioso animal que é o esquilo. Ele estava no chão, catando coquinhos. Quando me viu correu para um tronco, subiu por ele até uma altura de três metros, parou e me encarou, soltando curtos gritos, uma espécie de latido agudo e rápido.
Devo ter viajado por uns 30 quilômetros meio em ziguezague, incluindo a volta. Não havia poluição, só o cheiro de flores e de ervas desconhecidas. Se tivesse caminhado a pé teria feito um terço desse percurso. Não fiquei cansado, pois pedalei com calma, mais interessado em ver os detalhes da floresta e da vida que habita ali.