sexta-feira, julho 24, 2009

UM CORPO NA ÁGUA

Abel Aquino

Todo mundo tinha medo da correnteza naquele ponto do rio. As margens ficavam estreitas e as pedras negras e sempre molhadas da margem empurravam a água turva para o meio, onde ela rodopiava encrespada e descia velozmente por mais de cem braças até encontrar o remanço.
Marcilio parou sua montaria junto ao barranco e ficou, por alguns minutos, observando a corredeira. De vez em quando o sol brilhava na barriga prateada de peixes que desciam saltitando por entre as pedras.
De repente viu o corpo de uma pessoa rodando pela correnteza, de bruço, com sua roupa rasgada e balouçando nos movimentos da água. Por um momento Marcilio acompanhou o corpo, fustigando o cavalo e percorrendo a margem do rio, mas logo adiante o mato impedia a passagem e teve que afastar. Contornou o mato e, metros a frente, voltou a se aproximar da margem. Percrustou a água mais não viu mais o corpo.
Resolveu voltar para casa. Depois de espalhar a noticia rapidamente uma duzia de homens curiosos desceu em direção do rio para ajudar Marcilio a procurar o corpo. Ficaram a tarde toda percorrendo as margens acidentadas mas não encontraram nada. Marcilio ia a frente com o facão na mão, abrindo caminho no capim alto do brejo.
Depois de duas horas de procura começaram a duvidar da história.
Marcilio, ´ocê deve Ter visto coisa demais, disse Fúlvio, duvidando.
Não sou maluco, sô, respondeu Marcilio. – Vi muito bem! Era um defunto, boiando na água, sim!
Então, deveria ´tá parado nesse remanso, agumentou Crispim.
Era um defunto,sim! Repetiu Marcilio, já impaciente.
Eu não vou procurar mais, não, concluiu Fúlvio. – Logo escurece e a gente não pode ficar aqui para ser picado por cobra nesse matagal besta.
A gente pode não achar o corpo, justificou Marcilio. – mas que eu vi, eu vi.
Voltaram para suas casas, conversando, uns, achando que o rapaz estava maluco, outros, dizendo que poderia até ser verdade, mas faltava o corpo para tirar toda dúvida. Marcilio ficou alguns passos para trás, resmungando. Sabia que aquilo iria virar motivo de chacota, mas estava confuso. Olhou para trás ouviu o barulho da correnteza e pensou: será que me enganei?