Abel
Aquino
Na
chácara, passamos um mês comendo tomate, do pequeno, cujo pé havia nascido por
acaso. Deixei que crescesse. Quando ficou da altura do meu peito, estava caído
para os lados. Então cortei três varas, fiz uma escora e a armei sobre o tomateiro. Amarrei seus
delicados troncos nessas madeiras. Em pouco tempo, ficou carregado de
tomatinhos. Eles eram comidos em forma de salada. Eu os cortava em duas partes,
colocava numa bandeja, acrescentava azeite, shoyo, cebola fatiada e limão. Era
um prato especial.
Aproveito a deixa para dizer que, embora nosso
terreno seja diminuto, apenas 1.550m2, sendo que 400m2 é ocupado pela
construção da casa, mesmo assim plantamos e colhemos uma enorme variedade de
legumes. Temos, então, todo ano, abóboras, pimentas, cebolinhas verdes,
pimentões, jilós e até bananas.
Fico
admirado como a natureza é pródiga e só uma pessoa muito sem ânimo ou
descuidada é capaz de passar fome sobre seu pedaço de terra. Conheci, em Goiás,
gente passando necessidades mesmo vivendo em vários hectares de terra. Suas
moradias estavam cercadas de mato e a lavoura definhava sob as chamadas ervas
daninhas. Criavam galinhas e porcos, muitas vezes soltos pelo terreno. As
galinhas circulavam por dentro das suas residências, defecando na sala e na
cozinha, deixando no ar um cheiro de enxofre desagradável. Conheci um sitiante que construíra os ninhos
de suas aves na sala. Perguntei do porque deixava as galinhas chocarem seus
ovos na sala: disse-me, com simplicidade, que era para os bichos não as comerem.
No interior da residência a ninhada estava protegida. Era muito raro ver
hortas. Quando muito, formavam pequenos canteiros de cebolinhas e pés de
plantas aromáticas ou medicinais.
Acredito que esses comportamentos parecem ser uma
espécie de regressão à vida mais primitiva. São “brancos” que perderam os
costumes mais urbanizados e contemporâneos. De qualquer forma, isso revela o
quanto é frágil a evolução cultural do ser humano. Qualquer descuido e volta ele
à época das cavernas, pelos menos em termos de costumes.
Mas,
voltando a falar da nossa diminuta chácara, não posso esquecer que interagíamos
com a natureza.Usávamos nossas temporárias estadias como momentos de
relaxamento e reflexões. Quando tive que regularizar o terreno, fui obrigado a
derrubar uma meia dúzia de arvores, ato pelo qual fui multado pela Polícia
Florestal. De qualquer forma, a casa ficou ilhada no meio da mata, com
frondosas árvores cercando os quatros lados do terreiro.
Com essa proximidade, somos, com freqüência,
visitados por bugios, macacos pregos, e até sagüis barulhentos. Nossos mais
assíduos vizinhos são as sabiás, as corruíras, os bem-te-vis e os Joãos-de-barro.
Vários outros pássaros freqüentam nossa redondeza, mas ainda não foram identificados. As beija flores fazem ninhos na lateral do
telhado e os tucanos comem coquinhos do Jerivá carregado, grasnando de forma
desagradável.
Os fins de semanas que passamos nessa chácara são a
melhor forma de recarregar as baterias e dar descanso ao corpo, depois de uma
semana agitada na maior cidade da América do sul. Sem contar que, nesses dias
podemos comer melhor, elaborando nosso próprio e variado cardápio, gozando de
forma saudável dos prazeres de alimentar-se bem, dormir até mais tarde e de
relaxar a vida, ouvindo o canto dos pássaros e o barulho do vento nas folhas
das árvores.