quarta-feira, janeiro 21, 2009

O homem tossia todo o dia e toda a noite. Da minha casa, ouvir aquilo me angustiava. Nos dias de calor e sol ele tossia, nos dias de chuva ele tossia, nos dias de frio e vento ele tossia. Sua mulher fazia chá e o cheiro do chá quente espalhava-se pela redondeza. Os vizinhos iam visitá-lo e saiam cabisbaixos e silenciosamente caminhavam para suas casas. Nunca vi um médico visitá-lo; apenas o enfermeiro vinha, diariamente, aplicar-lhe injeção. Diziam que o medico o havia desenganado. Alguns vizinhos não o visitavam porque temiam que sua doença fosse contagiosa, outros evitavam visitá-lo porque não queriam sentir pena. Sua família não era grande. Os filhos, as vezes, brincavam no quintal, mas a maior parte do tempo ficavam com os avós. Na frente da casa havia uma palmeira, um belo pé de jerivá com três cachos carregados de coquinhos amarelos. Os periquitos gostavam de assentar alí e comer os frutos enquanto faziam uma enorme e estridente algazarra.
Quando a esposa saia na rua eu a observava caminhar em direção do mercadinho. Seus passos eram lentos e vacilantes, seu corpo inclinava ora para um lado ora para o outro. Parecia uma mulher fraca e triste, embora sem ar de doente. Seus cabelos eram mal cuidados e os pés calçavam uma sandália de tiras simples e desgastadas.
Mas a todo o tempo o homem tossia.
A gente desejava poder ajudar, poder fazer alguma coisa que curasse aquela criatura mas nada vinha a mente. Fui visitá-lo numa tarde fria e garoenta. Ele estava deitado na cama de solteiro armada no meio do quarto. Esta ficava bem no centro, de forma que as pessoas que o visitavam podiam rodear a mesma e observá-lo de todos os ângulos. O doente acompanhava a gente com o olhar e seus braços descansavam sobre o cobertor que cobria seu corpo. O travesseiro era alto e uma toalha encardida ficava amassada ao lado. Quando começava a tossir, ele pegava a pequena toalha e a leva a boca como que para expelir menos bactérias aos visitantes.

Numa noite calma e com lua cheia a tosse cessou. A casa ficou em silêncio. Apenas um pouco de luz escapava pelas frestas da janela do quarto. Não ouvi choro nem lamentos. Tudo estava quieto.Apenas os latidos dos cães da rua e o cricri dos grilos do quintal quebravam o torpor do ar fresco e leve da madrugada.
De manhã vieram contar que o vizinho havia morrido.